A primeira parte do processo de impeachment foi marcada por uma grande demonstração de mudança de conduta política. Essa metamorfose comportamental ficou extremamente clara no posicionamento de diversos deputados que, ao se posicionarem pelo impedimento ou não da presidente, deixaram claro que seu voto não era pelo que acreditam, mas pela necessidade de atender aos apelos das ruas e do eleitorado que, em sua grande maioria, apoia o processo de impeachment da presidente.
A pressão da sociedade em torno de um fato político não é notícia, mas o fato destes apelos terem sido ouvidos é uma novidade. O grande agente dessa mudança foi a tecnologia, que proporcionou ao povo as redes de relacionamentos. As plataformas sociais impulsionaram a disseminação de informação, o que deu aos movimentos como MBL, Vem para Rua e inúmeros outros uma importância jamais vista pelos políticos. Antes acostumados a ver o eleitor à distância, eles perceberam a vontade e a participação do povo de forma objetiva e direta.
Os dedos ágeis dispararam milhares de e-mail, tweets, posts de Facebook e mensagens de WhatsApp. Esses terabytes de cobrança massacraram e colocaram um holofote sobre os deputados, inclusive alguns que, em algum momento, chegaram a pensar que, assim como no passado, talvez houvesse espaço para negociação de benefícios. Pela primeira vez no Brasil, as redes sociais falaram mais alto que os interesses próprios, mostrando poder de organização na convocação espontânea para as manifestações como também para pressionar a classe política pelos direitos e vontade da maioria.
O megafone digital do povo surpreendeu até mesmo o Partido dos Trabalhadores, aquele com melhor compreensão sobre mobilização social e que, em seus 36 anos de vida, aprendeu como ninguém a arte do marketing ideológico. Mas nem toda essa experiência foi suficiente, e os profissionais ficaram muito atrás dos movimentos espontâneos. Comandados por meninos com discurso de homens, esses movimentos são movidos pela vontade de mudança, e deixaram claro que a política vai mudar pela governança da informação.
Antes isolada em Brasília, a classe política de agora em diante é monitorada a todo minuto e suas atitudes políticas e pessoais são avaliadas como decisões de estado. A participação proporcionada pelas redes sociais colocará Facebook, WhatsApp e as outras redes, daqui para frente, em pé de igualdade com as grandes mídias na balança da importância.
O distanciamento ficará cada vez mais difícil de ser atingido e os partidos e políticos que não mantiverem coerência partidária e de governança política de suas propostas e projetos terão problema. O que antes levava anos para vir a público hoje leva minutos. A participação proporcionada pela tecnologia trouxe um contingente gigante ao fórum de debates ideológicos, partidários e sociais.
O governo já admitiu que o processo de impedimento iniciado pela câmara dificilmente será parado no Senado, e a adesão constante de novos Senadores pela aceitação do impeachment deixa claro que o processo construído pelas ruas continua em funcionamento. Não tenho dúvida alguma de que as redes sociais sejam a razão desse posicionamento do Senado. Nossos parlamentares não devem esquecer do conceito “I'm watching you", e nem dos milhares e-mails e WhatsApps recebidos das duas partes do processo.
Espero que o engajamento social pelo impeachment abra uma nova janela de esperança, com a melhora substancial da qualidade de nossa classe política, que deverá se ater mais ao compromisso com a verdade e com a sociedade, e não somente à ideologia partidária. Brasil deve ser governado para o cidadão e não para os partidos, como vimos até hoje. Se essa pressão popular continuar, há sim um veio de esperança.
Cada dia que passa os cenários ficam mais confusos, pelas apostas em ambiente político e econômico. O desemprego aumentando a passos largos, inadimplência da cadeia organizada de fornecedores e dívidas bancárias, assim como a inadimplência em todos segmentos estão se acentuando com o passar dos dias. Desta forma, onde iremos ancorar as nossas expectativas de uma solução econômica que está a reboque da solução política sobre quem governa o país? Cada vez mais se acumula um grau maior de incerteza causada pela falta de ação governamental, o que está temporariamente paralisado pela disputa de poder.
Para o mercado em geral, a esta altura não interessa a questão da discussão sobre o contexto Jurídico e sim o que pode vir a impactar a vida de modo geral, pois alguns consensos já estão formados em relação ao que precisa mudar para que a economia volte a sinalizar confiança e que possamos voltar a rodar com perspectiva futura e os investimentos voltem a se normalizar.
A única certeza que temos é que para qualquer projeto econômico que dê perspectiva econômica para o país mudar sua rota de colisão, teremos de passar por reformas estruturais no Congresso, como a questão da previdência e até cortes nos benefícios sociais, além de outras que estão travadas. Essas medidas têm custo político de implementação pela impopularidade.
O embate do governo se cristalizou neste momento entre Dilma e Temer, juntamente com ala do PMDB que saiu da base aliada. O seu programa econômico batizado Plano Brasil, sem dúvida não apresenta grandes novidades, mas é um plano bem coerente e cola mais com o mercado embora também precise de apoio político, pois só será factível com medidas de aprovação junto ao Congresso. E é neste fato que o mercado enxerga maior probabilidade de reorganização econômica, dada a maior capacidade do partido em trazer o PSDB para apoiar o projeto junto ao Congresso.
A expectativa política e econômica, principalmente câmbio e bolsa estarão ancoradas nas votações da Câmara sobre o impeachment em todos os estágios, primeiro sobre a aprovação do encaminhamento do voto do relator que ontem foi aprovado, tendo agora o embate final no domingo próximo pelo Congresso. Mas acredito que o mercado já precificou grande parte do rito do impeachment dentro da velha máxima de mercado, que é: "sobe no boato e cai no fato".
Em um cenário onde o atual governo vença a disputa no Congresso, sem dúvida o novo governo Dilma deverá tentar reorganizar as suas bases políticas com partidos de menor expressão, como PCdoB, PSOL, PP e outros partidos menores de um governo mais à esquerda, além dos movimentos sociais como CUT, MST e outros que ganharão peso e tenderão a exigir um plano econômico que atenda ainda mais as demandas sociais deles em seu governo. Eles se fortalecerão e cobrarão a conta da salvação do seu governo. Sem dúvida será uma grande dor de cabeça para o novo governo Dilma/Lula.
Lula tem dito que a prioridade será novamente o emprego e crescimento e é deste discurso dissonante da realidade fiscal que o mercado não gosta, apesar de saber que normalmente o discurso de rua é repactuado com a realidade econômica. E Lula sabe bem como a economia funciona e também sabe que precisará acalmar os mercados novamente, como foi o caso quando se elegeu pela primeira vez. Assim, possivelmente tentará a mesma fórmula que deu certo em outros tempos e apresentará o nome de um Ministro da Economia que gere uma expectativa positiva, tentando induzir o mercado e a economia a superar este momento de crise aguda econômica.
Sem dúvida a tarefa do atual governo em caso de vitória será mais árdua do que a do Vice-presidente, pois o cacife de credibilidade está muito pequeno para dar a volta por cima de todos os problemas que não são apenas políticos, como os outros escândalos que vêm assolando o partido do PT.
Assim, para contextualizar os dois cenários: o atual governo deverá gerar maiores expectativas econômicas, dadas as dificuldades em recompor a sua base política, além de o próprio PT não conseguir acomodar todos interesses suprapartidários e próprios em relação à ocupação de cargos deixados pelo PMDB. Neste ponto, tanto dólar como a bolsa deverão sentir o impacto negativamente.
Já um novo governo assumido pelo Vice-presidente Temer, que será mais previsível e menos compromissado com qualquer ala, poderá gerar acordos mais "easy way" no mundo político, necessários para implementar reformas no Congresso.
Não adicionei mais pontos de imprevisibilidade de cenário alternativo, pelas variáveis como a Lava Jato e o TSE. Isso nos faria perder o foco no curto prazo.
Assim, a melhor parte do "day after" é termos alguma definição de para onde o país irá se dirigir, sem desconsiderar as dificuldades e desafios de ambos os lados, o que será sinalizado nesses próximos dias de definição, pois o país não aguentará por mais tanto tempo a disputa de poder.