Trump e Temer passam por momentos políticos conturbados, criados principalmente pela agressividade do processo eleitoral que envolveu a chegada de ambos ao poder. Por aqui tivemos um penoso e demorado processo de impeachment, agravado por denúncias e investigações que escancaram a corrupção estrutural em nosso país. O impeachment foi necessário para que se desentravassem as pautas e trouxesse de volta a confiança dos mercados, entretanto deixou sua marca. A reputação de nossas instituições está enfraquecida diante da opinião pública e, apesar dos investidores verem com bons olhos as mudanças que estão sendo implementadas, a insegurança da população em relação à parcela política brasileira é real e comentada diariamente nas ruas, e isso respinga no governo Temer.
Já ao norte do Equador, os Estados Unidos passaram por uma das eleições mais controversas dos últimos tempos. Além das prévias agitadas, com acusações de espionagem russa e sabotagem eleitoral, a ida às urnas também deixou o país com os nervos à flor da pele. Com a economia oscilando, ainda resquício da crise de 2007, os americanos apostaram na figura polêmica de Donald Trump em detrimento de Hillary Clinton. Em uma eleição disputada e vendida como uma luta do novo contra o velho, a promessa do empresário em “Make America Great Again!” conquistou os votos e garantiu a vitória em um dos sistemas eleitorais mais complexos do mundo.
Com esses contextos em mente, era de se esperar que a governabilidade de Temer, acusado de golpe, fosse pior que a de Trump, que se tornou o presidente com a vitória nas urnas. Entretanto, como todos bem sabemos, as águas da política nunca são tão claras, e as marés nunca se repetem a ponto de permitir previsões com alguma precisão.
Virtual desconhecido da população em geral, Michel Temer é renomado na política pelo perfil articulador e conciliador. A prova disso foi o fato de ter bem-sucedido na tarefa de unificar o PMDB, algo que nem mesmo FHC e Lula conseguiram. Além deste feito, Temer trouxe os demais partidos para sua base, obtendo assim vitórias desde que assumiu a Presidência da República ano passado. Aprovou a PEC dos Gastos e avançou as discussões sobre a Reforma da Previdência e Política. Também montou uma equipe econômica que conseguiu domar a inflação, aliviando o bolso da população, o que é sempre bem recebido pelo mercado. Nem todas essas vitórias, entretanto, são capazes de domar as ruas que, em sua maioria, rejeita o seu governo.
A situação é exatamente inversa no hemisfério norte. Fossem palavras, Trump seria o antônimo de Temer. O presidente americano é adepto de um estilo polêmico, já conhecido através do reality show O Aprendiz, algo que seduziu boa parte do eleitorado, mas que faz com que o presidente colecione desafetos até mesmo dentro do próprio grupo político. Em um governo composto basicamente por dois partidos, o Republicano e o Democrata, ter domínio do próprio quintal é requisito obrigatório para governabilidade. Faltaram a Trump votos republicanos suficientes até para aprovar o nome de um Secretário e, ao invés de conciliar, Trump manteve o estilo.
Sua última derrota foi a retirada de pauta do projeto que visava substituir o Obamacare pelo chamado Trumpcare. Mais uma vez faltavam votos dentro do próprio Partido Republicano, o que levou o governo a retirar o texto de votação. A implosão da pauta coloca em cheque a imagem projetada pelo presidente americano durante a campanha, de que sua experiência empresarial seria uma vantagem quando em mesas de negociação política. Sua próxima incursão é a reforma tributária e, a julgar pela experiência até agora, Trump pode não alcançar o resultado desejado. É importante lembrar que Barack Obama governou sem ter maioria no Congresso, e mesmo assim aprovou o Obamacare.
Governabilidade é uma conquista diária, onde Brasil e Estados Unidos tem muito a aprender um com o outro. É importante lembrar sempre que um governo que não conta com apoio das ruas, não persiste, e um presidente que é apoiado pelas ruas mas não tem os votos necessários para fazer valer sua vontade, não existe. Negociação é um jogo de ganha-ganha e, em política, faz bem a todos lembrar que, não importa o modelo e o estilo de governo, quem tem que ganhar é sempre a população. Só assim um governo pode não só existir, mas também persistir.
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